Sou um homem de fé.
Não sou religioso, não acredito na divina providência, nunca que me recorde,
fiquei acordado à espera que o menino Jesus colocasse uma prenda no meu
sapatinho. A minha fé não se espelha nesses recursos.
Tenho fé na natureza, num
equilíbrio cósmico, na inevitável caminhada do ser humano em busca da equidade,
da justiça.
Acredito na
solidariedade, acredito na diferença enquanto motor do desenvolvimento,
acredito piamente que um dia, no futuro, todos encontrarão o seu lugar no
mundo, acredito que ninguém verá o seu espaço usurpado, a sua dignidade
abusada, a sua vontade subjugada a interesses egoístas de alguns, que no fito
de atingirem poder e notoriedade, construíram uma sociedade à sua imagem, um
imenso castelo de cartas sempre em precário equilíbrio.
Nesta época do ano,
que é ao mesmo tempo de reflexão e de solidariedade, em que é suposto pararmos,
repensarmos as nossas vidas, ponderarmos o nosso caminho, gostaria de poder
dizer aos meus filhos que vivemos num mundo em que um por cento dos homens não
detém mais de vinte por cento de toda a riqueza.
Gostaria de lhes poder dizer que a riqueza
desse um por cento não se constrói sobre o sofrimento dos demais, que não
existem desigualdades que levem crianças como eles a trabalhar horas sem fim,
fazendo brinquedos que outras crianças usarão.
Gostaria de saber que
todos são de facto iguais perante a lei, que todos têm o mesmo direito à
educação, à saúde, que todos sem excepção podem decidir de igual modo sobre o
que a todos pertence.
Gostaria de ver os
velhos viverem o fim dos seus dias em conforto, com os sonhos cumpridos,
arredados do fantasma da solidão. Gostaria que o homem fosse, apenas, e não que
fosse aquilo que possui.
Gostaria de fazer
parte de uma sociedade que assumisse ser o colectivo muito mais do que a soma
de todos os que a compõem, uma sociedade em que cada um pudesse dar o seu
contributo escolhido e não o que lhe é imposto para assegurar uma subsistência
que deveria estar garantida desde o seu nascimento.
Gostaria de ter nas
mãos a resposta, não apenas no coração.
Mas sou um homem de fé
e sinto no fundo de mim… que um dia chegará essa alegria suprema de viver em
liberdade no meio de gente livre.
A minha fé é lutadora,
porque sei da importância das coisas pequenas, sei que com pequenos passos se
faz o caminho e sei também que os passos de um homem, podem ser os de todos,
porque sempre foi assim, porque do exemplo se faz a luta.
Há quem diga que Natal
é sempre que um homem queira, como não sou crente, prefiro recorrer à ancestralidade
e festejar o Solstício de Inverno, o tempo que celebra um novo ciclo, o retomar
da vida, as novas sementes que se lançarão à terra.
É isso que vos desejo
nesta quadra, que lancem à terra novas sementes de igualdade e de
solidariedade, e que elas floresçam e frutifiquem e que juntos cuidemos delas.
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