Os liberais ou neoliberais
ou tecnoliberais ou qualquer coisa liberais, não são políticos, são negociantes
e precisamente por isso são perigosos. Não são gente de fé, são gente de
fezadas.
Tudo neles, depois de
despidas as vestes retóricas, se resume a uma visão de merceeiro, a um deve/haver,
em que os réditos lhes pertencem e os débitos são descarregados nas contas dos
outros. Convém frisar que os outros não são gente, são clientes, entidades, bolsas
e bolsos que se esvaziam na razão direta da sua utilidade.
Para eles a dignidade
não é um valor em si mesma, é isso sim, uma escala cuja medida é o dinheiro, porque os clientes não se medem por valores
absolutos, medem-se pelo poder de compra e, nesse contexto, uns terão direito a
atendimento personalizado, outros ficam de fora à espera das sobras, que
comprarão mediante as suas posses.
Não surpreende por isso
que Manuela Ferreira Leite tenha proposto uma suspensão semestral da
democracia; para ela não eram direitos que estavam em jogo, o objectivo era
simples, pretendia apenas uma pausa para inventariar os stocks e adequar a
estratégia ao que tinha disponível para colocar nas prateleiras. A seu ver a
democracia não é uma questão de fé, apenas uma fezada, uma excelente oportunidade
de crescimento gerada pelos efeitos de uma publicidade enganosa.
Como poderemos então
estranhar que a dita senhora tenha defendido o pagamento integral da
hemodiálise para pessoas com idade superior a setenta anos? Qual a utilidade
desta gente? Não produzem riqueza, não compram, não são clientes, não estão cá
a fazer nada!
Que morram então.
Aliás, se atentarmos
nas listas de espera para cirurgias, ou para intervenções mais onerosas,
veremos que estes cidadãos vivem calvários de anos, se analisarmos o fecho dos
centros de saúde por exemplo, percebemos de imediato qual a faixa etária mais
afectada. Manuela Ferreira Leite limitou-se a dar voz ao genocídio.
Quando vemos
consagrado na Constituição, um Serviço Nacional de Saúde Universal e
tendencialmente gratuito, percebemos logo que há ali alguma coisa a mais, uma
contradição, uma sabotagem. O lógico seria retirar o tendencialmente, mandá-lo às
urtigas. Em Portugal a tendência é sempre o declive. Tudo o que tende, tende a
acabar.
O SNS deveria ser
universal e gratuito. Para todos, ricos e pobres sem excepção, deveria mesmo
ser gratuito para Manuela Ferreira Leite, tendo ela como tem, mais de setenta
invernos.
Pagamos para isso,
trabalhamos para isso, não temos de poupar para isso. A qualidade dos serviços
prestados deveria ser generalizada e sem custos para os utentes. Se alguém
quisesse um extra e não se importasse de pagar por isso, esse upgrade, digamos
assim, deveria ser o hospital hotel, com lençóis de seda e pratos de porcelana,
com Jarbas privativos, com arrastadeiras únicas, peças de design escatológico,
suaves ao toque e odoríferas… Porque no que à saúde diz respeito, os hospitais
não são hotéis, são a salvaguarda da nossa saúde, da nossa dignidade, da nossa
democracia. Em suma os hospitais não são uma fezada.
Mas como diria o
outro, isto é tudo uma piolheira…
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