quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Dobregados


Dobregados vão os barcos quando as bordas ficam rentes à água do mar.
Dobregados vamos nós, rentes também à água do mar, prestes a afundarmos, carregados de lastro iníquo de impostos, de cortes, de vida miséria.
Habitamos um país que renunciou a ser Estado, um território governado desonestamente por gente que se amanha, que zela pelos interesses dos donos, como mascotes amestradas, feitas à escala humana, treinadas no circo do fingimento, alimentadas das migalhas que caem do pão que os seus mestres roubaram.
Nos guetos havia polícia que aguentava a vida dos guetos a troco da repressão sobre os seus. Repressão a mando dos opressores, repressão cega, hedionda, letal. Dignidade vendida por trinta dinheiros, com direito a bastão, comida e estrela de outra cor.
Dobregados de infâmia vamos nós que temos filhos e nos sujeitamos ao crime. Nós que abdicamos de amanhã a troco de mais um hoje esfarrapado e sujo e pobre.
Querem agora inventariar pobres, para que nos esqueçamos que pobres somos todos, indigentes, sem liberdade, sem rumo, sem auto-estima, sem sim nem não; apenas com o amen dos tristes, dos pobres de espírito que ainda não atigiram que se os ricos não conseguem encolher os camelos, de certeza aumentarão o buraco da agulha, porque o reino dos céus é um condomínio privado que eles habitam há muito.

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